quarta-feira, 1 de outubro de 2008

TRADIÇÃO




Aqui na Bahia desde o dia 27 de setembro começa a temporada de carurus. Um programa típico é ir ao caruru na casa de não-sei-quem. Para quem não sabe, ir a um caruru é saber que encontrará provavelmente no menu : caruru, vatapá, galinha cozinha, frigideira, feijão de corda, arroz branco, farofa de dendê e cocada, no mínimo.

A depender da crença do anfitrião, podem ter variações de como será o evento (lembrando que nós baianos vivemos um belo sincretismo religioso).



Vou contar o que eu conheço desde criança e talvez por isso adore esse encontro familiar e de amigos:

Tenho várias tias católicas e pra minha sorte cada uma é devota de um santo. Logo, é certeira ter pelo menos caruru pra Cosme e Damião, como também para Santa Bárbara. O roteiro é o seguinte: às 18:00 em ponto, a mesa já arrumada para sete meninos, ao redor da mesa os convidados rezam e cantam músicas para o Santo prestigiado. Sem contar que na mesa, em local de destaque está a imagem do referido santo. As cantorias e orações só terminam quando todos os sete meninos (ou meninas) terminarem de comerem (muitas vezes de mão mesmo), inclusive de comerem os doces. Tudo muito bonito e alegre. A sensação é contagiante. Só depois disso é servido o caruru para os outros convidados. Presencio isso desde menina e é bem provável que já fiz parte da mesa como um dos ‘sete meninos’. Com a correria do mundo atual, tenho uma tia super prática que ao invés de convidar os sete meninos, faz sete marmitas e entrega nas devidas residências. As rezas e cantorias permanecem intactas.



Nossa vizinha de muitos anos é da umbanda. Todos os anos ela sempre distribuía sacolas com doces e guloseimas. Eu e a Cris (filha dela) ajudávamos na confecção das sacolinhas e muito espertamente guardávamos os melhores doces para degustarmos durante o restante do mês todo. Além disso, lembro que no portão dela a fila para entrega dos doces de Cosme e Damião era imensa. Facilitávamos a entrega e a logística da operação. De uns anos pra cá, a vizinha alterou a entrega de doces para oferecer o tradicional caruru. Sinto saudades dos doces, mas devo confessar que o caruru dela é maravilhoso. Com isso, a rotina da véspera mudou. Sei quando terá o caruru antes mesmo dela convidar. Escuto o galo cantar e as galinhas reclamarem. Elas são compradas só para a ocasião. Durante o preparo, as mulheres cantam as canções típicas de oferenda para o Orixá homenageado. A depender da época, o caruru é aberto para convidados ou fechado só para o pessoal da umbanda. Quando é aberto, nós convidados só podemos comer dentro da casa, não se pode levar nada. Quando é fechado, ouvimos o som dos atabaques e as melodias que envolvem a alma e nos faz querer sair dançando.



Não sou nem católica, nem umbandista, sou espírita e amo vatapá, logo, adoro qualquer tipo de ‘caruru’. Claro que esse tipo de comida, você tem que saber onde comer (senão é piriri na certa!).

Na Bahia, ir para o caruru na casa de alguém é ter a certeza de estar participando de um evento único e antigo. É apreciar a boa culinária africana e aproveitar para pedir ou agradecer algo de bom.



De qualquer jeito é sempre um encontro com os mais chegados e com o divino.


By Fulana



2 comentários:

Unknown disse...

Adoro carurú, neste último sábado, fui prestigiar mais um, com muito prazer. Já fiz parte várias vezes da mesa dos 7 meninos..rs Tempo bom...
Adorei o texto tb. Ahh, Carol achei a resposta. Grata.
bjos e saudades meninas.
Mila

Anônimo disse...

Saudade... muita saudade da Bahia
Beijos